Ensaio fotográfico Pierre Michel Jean
Textos Daniel Lima e Raquel Borges

 

Neste exato momento Emilien (nome fictício) haitiano, 36 anos, nascido em Gonaïves, atravessa uma floresta pantanosa entre a Colômbia e o Panamá. Num caminho inverso, Emilien relembra sua ida ao Brasil. Agora ele refaz a rota no sentido inverso, desta vez para sair do Brasil em direção aos EUA.

Partindo de São Paulo por avião até Porto Velho, tomou um ônibus até Rio Branco e de lá cruzou de taxi a fronteira com o Peru. De ônibus, Emilien cruzou o Peru, o Equador e a Colômbia. A fronteira com o Panamá é sua próxima etapa. De lá tentará embarcar para os EUA com documentos falsos feitos em São Paulo. No seu “novo” passaporte a nacionalidade congolesa, acompanha novo nome, nascimento e parentes. Tudo a ser devidamente decorado para o pedido de asilo político nos EUA.

Acompanhamos o último dia de Emilien em São Paulo. A esperança que se mistura à despedida e ao desafio de uma nova jornada de migração. Suas expectativas refletidas nas imagens captadas pelo fotógrafo haitiano Pierre Michel Jean.

Emilien veio ao Brasil em 2013. Atravessou a rota da imigração cruzando a República Dominicana, Panamá, Equador e Peru até chegar à fronteira do Brasil. Sua entrada foi pelo Acre como milhares de haitianos. O final de sua longa trajetória foi em São Paulo capital. Final? Na verdade o começo de uma outra jornada à procura de trabalho, condições de vida e manutenção de sua esperança num futuro melhor.

Emilien, formado em administração de empresas, é plural em suas aptidões artísticas: ator, escritor, compositor e cantor. Poliglota, fala criolo, francês, espanhol, inglês e português. Talentos que o levaram a participar de uma peça de teatro com elenco haitiano. Após meses de ensaios, veio o sucesso de público e mídia. Apesar de toda a repercussão, a peça que arregimentava mais de 10 profissionais, saiu de cartaz por falta de recursos financeiros. Novamente Emilien se viu em um limbo, não sabendo ao certo o que o esperava no futuro.

Neste período, paralelamente a crise econômica brasileira se entranhava na mente e bolso dos brasileiros. Menos oportunidades de trabalho e sem grandes perspectivas. Com ajuda da mãe que mora nos EUA, Emilien consegue pagar a quitinete e alguns custos diários. Enquanto mostra as mensagens por Whatsapp com a mãe, logo imagina o reencontro nos EUA.

Estimulado pelo novo fluxo de saída que se forma na comunidade haitiana em São Paulo, decide desafiar a sorte como vários outros numa nova rota de imigração. Vai atrás agora da “terra das oportunidades”.

Encontramos Emilien logo pela manhã na sua quitinete alugada em Guarulhos, cidade ao redor de São Paulo Capital. Ele nos recebe com olhar atento e vivo de quem a horas está acordado e pouco dormiu. Acompanhamos Emilien à farmácia para as últimas compras.

No pequeno espaço do quarto, a mala bem organizada sem pesos desnecessários. Nos artigos de banho se destaca o creme de clareamento de pele – prática que se espalhou entre os haitianos no Brasil para se tornarem mais “abrasileirados”.

Deixamos para trás o quarto alugado, sem despedidas. No contraste da cidade Emilien se destaca, preparado para como viajante mochileiro para diferentes situações. Uma boa mochila bem atada ao corpo, botas, calça jeans, camiseta e casaco. Emilien sabe que talvez tenha que ficar muitos dias com estas roupas. Paramos para uma foto antes de entrarmos no metrô.

Conversamos no caminho ao aeroporto, sobre o caminho a ser feito no norte do Brasil. Sua preocupação maior reside no Estreito de Darien, na fronteira da Colômbia com o Panamá, grande pântano de mata densa separando Província de Darién, Colômbia na América do Sul, ao Panamá, na América Central. Região conhecida pela presença das FARC (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia).

 

No vagão do metrô, apertado em meio aos brasileiros, a última foto de Emilien no Brasil.